Friday, September 22, 2006

O autor fala do livro

Altamir Tojal situa Faz que não vê na tradição do “romance de formação”, uma forma originada na literatura alemã, em que o personagem é confrontado entre seus ideais e a realidade. O livro é construído como um thriller político, tendo como protagonista um ex-guerrilheiro que se converte em yuppie. O romance está disponível no portal da Cultura e começou a ser distribuído nas livrarias pela Editora Garamond.

Como você define o livro?
- Eu o situaria na tradição do “romance de formação” (Bildungsroman), entendido no sentido amplo, de narrativa da aventura interior do protagonista que parte de uma atitude de confronto com o mundo, é marcado pelos acontecimentos e enfrenta o contraste entre a vida que idealizou e a realidade. Há quem considere esta forma exaurida, mas eu entendo que não. O livro conta a história de um ex-guerrilheiro que se converte em yuppie. É também um thriller, ambientado no submundo em que se misturam política, negócios e crime.

Qual a razão do título Faz que não vê?
- A história procura levar o leitor aos meandros do submundo da corrupção e do crime. É um universo que todos conhecemos, que alcança a todos nós, mas, muitas vezes, tentamos não ver e esquecer.

O livro também mostra um ambiente sindical corrupto e violento. Na sua opinião, ainda é assim ou você se baseou no passado?
- A corrupção e a violência no movimento sindical não é um mal contemporâneo nem um vício brasileiro. A história do sindicalismo norte-americano, por exemplo, se confundiu com a da máfia por muito tempo. Isso não significa que todo o movimento sindical seja corrupto. Sem o sindicalismo combativo e comprometido com a defesa dos direitos e conquistas dos trabalhadores o capitalismo seria mais perverso e atrasado.

Em que medida sua experiência pessoal contou para o enredo?
- Acho que a experiência de vida do autor conta bastante nas histórias que escreve. Admito, é claro, que os episódios políticos que vivi e o meu trabalho na interface do mundo corporativo com a mídia ajudaram na construção da história e do protagonista. Mesmo sendo uma obra de ficção, diversas situações foram desenvolvidas a partir de cenas das quais participei e testemunhei.

O personagem principal trai os ideais da juventude? Você ainda mantém os seus?
- Não acho que o protagonista tenha traído os ideais da juventude embora admita e respeite que pessoas, ao lerem o livro, cheguem a essa conclusão. Para mim, hoje, está claro que tínhamos as melhores intenções mas nem tudo que pretendíamos corresponderia, se fosse feito, aos nossos próprios desejos e sonhos. Hoje, acho perfeitamente possível ter os mesmos ideais e procuro preservar os meus, apesar de toda a onda niilista resignada, da conversa fiada de que ninguém presta e que tudo está errado. A diferença é que hoje tenho ideais mais firmes, temperados nos erros e também nos acertos.

O livro iguala personagens e revela desprezo pelas utopias. Trata-se de um olhar cínico e sem esperança?
- De fato, não há invulnerabilidade nos personagens, sejam perdedores sociais ou supostos ganhadores. Todos se assemelham na busca de objetivos, quase sempre a qualquer custo. Também não há saída da realidade para qualquer utopia ou transcendência. Mas isso não significa necessariamente cinismo e desesperança. Mostra simplesmente que não há possibilidade de fuga de nós mesmos nem do aqui e agora.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home